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Trabalho profundo: como prosperar em mundo distraido

Lições de um executivo de marketing com TDAH para conseguir ter foco

Eu tenho TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade). Então… Eu tenho problemas para focar.

Essa edição é o ponto de vista de alguém desfocado sobre… trabalho focado.

Mas por que falar sobre isso numa newsletter de growth?

A nossa proposta é te ajudar a resolver problemas complexos, geralmente por meio de um framework, de uma nova abordagem ou da revisão de um conceito.

Mas só adicionar novas teorias não é o suficiente para a nossa missão.

Você já trabalha muito, eu imagino.

Só acrescentar mais um punhado de horas à sua rotina pode representar um esforço adicional que não necessariamente reflete em resultados - quanto mais resultados imediatos.

De forma geral, há pouco espaço só para trabalhar mais.

Discutir formas de trabalho, portanto, é tão importante quanto discutir as ferramentas pelas quais trabalhamos.

Cal Newport, autor do livro Deep Work, descreve que o trabalho profundo é composto por “atividades profissionais performadas em um estado de concentração profunda, livre de distrações, capaz de esticar sua capacidade cognitiva até o limite".

Com a crescente aceleração da vida e trabalho, é paradoxal o fato de que a habilidade de focar esteja cada vez mais rara e a gente comprometa boa parte da nossa energia com atividades superficiais.

🧠 Tempo para escrever: 6 horas
📖 Tempo de leitura: 15 minutos
✍️ Na última edição: Plano 30-60-90: como se dar bem no início como CMO

Boa, mano. Texto muito útil para quem estiver passando por isso no momento.

Acho que vale uma próxima edição diferenciando como é trabalhar tanto com CEOs e executivos que acreditam em marketing…

… Quanto especialmente em lugares onde a liderança não compra a ideia - o que acredito que seja o cenário mais comum dentro das empresas.

Um conteúdo que traga essa visão de como conquistar os stakeholders pode ser uma boa.

Já escrevi algo parecido no passado mas seria massa ler sobre isso a partir da perspectiva e vivência de vocês. Sigo te acompanhando!

Vinicius Romolo, growth marketing manager do Grupo VG e assinante Growth Insight
Nota do Collins 1: Muita gente pediu o "Manual de Como Trabalhar Comigo" que eu prometi. Tive que editar algumas coisas e demorei para enviar, já mandei para alguns. Vou deixar como link aberto na próxima edição. :)

Nessa edição você vai ler:

Eu tenho TDAH

Isso tá na moda, uma galerinha cool adora falar que tem déficit de atenção e postar foto de comprimidinho laranja. Ou conta qual remédio que toma com um quê de orgulho por se achar mais estranho.

Ou usa isso de desculpa simplesmente por ser uma pessoa distraída.

Mas não é desse lugar que eu falo.

A minha história com o TDAH é recheada de sofrimento. O meu diagnóstico só veio depois dos 30 anos, a partir de uma avaliação neuropsicológica que aplicou dezenas de testes durante 10 semanas seguidas e de mais 4 meses de acompanhamento com um psiquiatra.

Para ser classificado como um adulto funcional eu preciso tomar uma dose alta de uma droga extremamente viciante e ter acompanhamento profissional em um programa de tratamento que me custa mais de R$ 15 mil por ano.

Não é tão legal assim.

Mas essa edição não é sobre o meu transtorno (talvez uma edição futura?), ela é sobre a nossa capacidade de trabalhar longos períodos de tempo de forma a realizar trabalho relevante e de qualidade.

É o ponto de vista de alguém desfocado sobre… trabalho focado.

A edição dessa semana é inspirada no livro Deep Work — Rules for focused success in a distracted world, cuja proposta é , em um mundo de distrações, enaltecer o foco como caminho para criar mais valor e resultados na sociedade.

Nota do Collins 2: Invadi a edição do Witt para contar que também tenho diagnóstico parecido, e que saber o que é e se cuidar é muito importante. Pode ser a diferença entre ter um superpoder ou só um limitante. Busque orientação médica.

Esqueça o peixe dourado e os 8 segundos de atenção

Em 2015 a Microsoft Canadá publicou um famoso estudo sobre a atenção humana (link original aqui) onde afirmou que o tempo de atenção das pessoas havia caído de 13 para 8 segundos, sendo superadas em concentração pelos peixinhos dourados, cujo foco dura cerca de 9 segundos.

Não sei como alguém acredita nessa bobagem.

Matéria na Time - A ironia em "2 minute read" Haha.

Os dados são de 2013 e, até onde eu sei, todos os filmes dos últimos 10 anos duram mais de 8 segundos, vocês maratonam suas séries favoritas num ritmo que nos leva a questionar se são humanos ou almofadas mais confortáveis, em média 48% dos nossos assinantes efetivamente leem as edições semanais dessa newsletter, cujo tempo médio de leitura é 17 minutos.

Até o peixe foi difamado. 🐡 

Bom, nós não somos um bando de 10-second Toms (referência de "Como se fosse a primeira vez", com Adam Sandler, como o filme tem 1h39 de duração, talvez você não tenha pegado a referência), mas é verdade que não suportamos o tédio.

Vivemos em um mundo distraído, impulsionado por uma vida multi-telas com internet de alta velocidade.

Aquela página ou planilha demora um pouco mais pra carregar e a nossa mão procura automaticamente o celular, no Uber, no consultório e até no elevador sem área, qualquer segundo de ócio é preenchido por uma tela.

Vivemos na sociedade do cansaço onde até mesmo nossos hobbies precisam ser produtivos e “fazer nada” é um eufemismo para fazer alguma coisa de forma despreocupada.

As 4 regras do trabalho focado

Com a importância do trabalho focado e profundo em perspectiva, Cal Newport propõe quatro regras muito práticas para adotá-lo de forma consistente em nossas vidas.

Na perspectiva de alguém com uma mente barulhenta, essas regras contribuem para o raciocínio (organização de pensamentos), servem de ferramenta para lidar com os problemas diários do TDAH.

E, se tem potencial para clarear mentes transtornadas, certamente são úteis para profissionais com desafios complexos.

Regra #1: Defina seu método de trabalho focado

Em um mundo repleto de distrações e após anos de provocação, nosso cérebro desaprendeu a resistir a elas e força de vontade sozinha não será o suficiente para criar um novo comportamento.

Há 4 formas de abordar esse tipo de trabalho que funcionam melhor ou pior conforme as preferências do indivíduo e o contexto onde está inserido.

  • A abordagem monástica - a mais difícil - é a decisão de maximizar os esforços de concentração ao eliminar as obrigações superficiais.

  • A bimodal dedica dias exclusivamente ao trabalho focado e deixa o restante da semana livre.

  • A rítmica é mais mais comum, separando horas de trabalho profundo a cada dia, e usando o restante do tempo para lidar com as obrigações profissionais.

  • E a jornalística, que propõe uma rápida (porém muito difícil) transição do modo distraído para profundo a qualquer momento do dia.

Regra #2: Abrace o tédio

Se concentrar intensamente é uma habilidade que deve ser treinada, fazer literalmente nada é uma das ferramentas para isso.

Aprimorar sua habilidade de concentração e de construir uma cadeia de pensamentos começa pela sua capacidade de superar o desejo por distração.

Enquanto cada momento de tédio da sua vida for desconfortável e precisa ser aliviado por distrações, sua mente não estará treinada o suficiente para o trabalho profundo.

Cal Newport

Outra teoria mostra que o cérebro tem o modo focado e o modo difuso.

O primeiro é quando você está fazendo uma ação que demanda bastante atividade cerebral. E o segundo é quando você não está prestando atenção no ponto de “trabalho” (escovando os dentes, dirigindo, etc).

E esse tédio te libera para fazer conexões neurais mais longas.

Regra #3: Saia das mídias sociais

Redes sociais não são a única fonte de distração da nossa vida, mas certamente são a causa mais famosa.

Não é preciso ter uma abordagem radical.

Cal propõe encarar as mídias como como um ferreiro escolhe as ferramentas que mais ajudam na forja e o fazendeiro, as máquinas que otimizam sua colheita: uma ferramenta que otimiza seu trabalho e vida, cujos benefícios superam confortavelmente os custos.

Regra #4: Drene o superficial

Trate o trabalho superficial com desconfiança, reconheça o potencial distraídor dele e os danos que causam aos resultados.

Convenhamos, este tipo de trabalho é inevitável, mas precisa ser confinado aos momentos em que não atrapalhem a sua habilidade de aprofundar seus esforços que verdadeiramente estabelecem seus resultados.

6 técnicas de um executivo com TDAH para trabalhar focado

Essas não são técnicas de produtividade, mas de adaptação.

São pensadas para quem reconhece os efeitos das distrações no seu rendimento e deseja explorar a ideia de um trabalho profundo e focado, essas técnicas são uma forma de treinar sua concentração.

Compartilho elas a partir da minha própria experiência, algumas são sugestões presentes no próprio livro e adaptadas para a minha realidade, outras foram idealizadas a partir de outras referências, mas todas foram testadas na vida real por este que vos escreve.

Essas técnicas não são um manual para o bom trabalho e nem mesmo ideias que devem ser eternizadas na sua rotina. Considere-as uma porta para experimentar maiores níveis de concentração, algumas são como por um pezinho na água enquanto outras são um salto de cabeça.

#1 Realize um grande ato (método de trabalho):

Pague por uma posição em um coworking, saia de casa para trabalhar, não leve seu carregador de notebook.

Esses grandes gestos rompem com seu padrão comportamental te impendem de entrar em modo automático, um estado mais suscetível à distrações. Além disso, gastar dinheiro ou tempo cria a sensação de dívida e te faz buscar por retornos que justifiquem o investimento.

#2 Inverta a lógica das pausas (abrace o tédio):

Em vez de agendar um bloco de tempo para se afastar das distrações e se concentrar, agende pausas do foco onde você se permite distrair.

#3 Treine com tarefas importantes (abrace o tédio):

Aqui é o “abrace o tédio” só que invertido. Não se dê espaço para entediar.

Escolha uma tarefa complexa e defina um prazo claro e muito apertado que exigirá de você trabalhar com grande intensidade para cumpri-lo, trate a tarefa como se fosse urgente e inegociável.

#4 Teste sua ausência por 30 dias (saia das mídias sociais):

Simplesmente delete os apps do seu celular e bloqueie os sites no seu computador. Não faça drama, nada de stories comunicando sua decisão e despedidas, simplesmente suma. Nesse período, analise três coisas:

  • A presença dos sintomas de abstinência ao longo do tempo. Entenda quão aguda é a reação inicial para entender seu grau de dependência e revisite esse sentimento constantemente para construir uma série histórica baseada na intensidade.

  • A sua insignificância perante os demais. É comum justificar nosso consumo de mídias com “faz parte do meu trabalho", “todas as minhas amizades e familiares estão lá”. Simplesmente suma para notar que muito menos pessoas do que você acredita notarão a sua ausência.

  • O papel das redes sociais na sua vida. A gente só dá valor depois que perde, não é? Utilize esse tempo para avaliar quais foram, de fato, as oportunidades que você perdeu e quais outras surgiram.

#5 Torne-se difícil de contatar (drene o superficial): 

Remova o e-mail corporativo e o app de mensagens do celular, coloque seu telefone no silencioso e não responda WhatsApp após as 18h.

Combine com as pessoas qual é o sistema de comunicação que funciona pra você.

Eu tenho alinhado com meus pares e time, por exemplo, que urgências devem ser resolvidas por ligação, que toda comunicação assíncrona não é urgente e tem horário pré-definido para ser respondida, que e-mail é exclusivo para assuntos oficiais ou externos, e que WhatsApp não é ferramenta de trabalho.

#6 Treine com o calendário (drene o superficial):

Nós subestimamos o tempo necessário para realizar tarefas e temos dificuldade em mensurar o tempo gasto após os eventos.

Por isso, divida seus dias em blocos de atividade - incluindo almoço, pausas para relaxar e tarefas pessoais. À medida em que o dia corre e seu plano é interrompido (ou o tempo estimado é incorreto), utilize esses acontecimentos como feedbacks e refaça os blocos para o dia seguinte.

Repita o processo até que os “tempos e movimentos” do seu ambiente e rotina estejam bem mapeados para que você possa se planejar com qualidade.

Escolha o que é valioso e raro

É provável que, para aumentar seus resultados, você deva fazer menos coisas, não mais, identificando o que é importante em meio ao ruído e distrações

Até mesmo o “trabalhador do conhecimento” ainda é cobrado por indicadores industriais de produtividade — executar muitas coisas de uma maneira visível.

E como estar ocupado é visto como algo bom para os negócios e até para a carreira, o trabalho profundo ainda é raro.

Vivemos em um sociedade onde estar ocupado é uma regra, a síndrome de burnout atinge 30% dos profissionais e constrói-se uma cultura de desempenho e trabalho incessante.

E é por isso que o trabalho focado é valioso.

Ele nos ajuda a dominar coisas difíceis e a produzir resultados em nível profissional, habilidades fundamentais para prosperarmos numa economia que migra do trabalho manual para o conhecimento.

Investir nesse tipo de trabalho representa uma oportunidade muito singular de defender a própria saúde e aumentar seu valor de mercado ao mesmo tempo.

Mas, em um mundo onde nossa capacidade de concentração é frágil ao ponto de sequer questionarmos nossa equiparação a um peixinho dourado, desenvolver essa habilidade pode ser mais difícil do que parece.

Qual a nota dessa edição?

(pessoas educadas respondem)

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