3 ideias para competir contra grandes empresas

Um gorila de 250kg domina seu mercado, o que fazer para derrubá-lo?

Se você fundou ou trabalha em um startup, é provável que tenha um ou mais competidores consolidados - chamados incumbentes.

Essas empresas têm recursos, experiência e autoridade de sobra. O enfrentamento direto tende a terminar com a startup fora de cena - somente 1 em cada 4 sobrevivem cinco anos.

Não há - e nunca haverá - um playbook definitivo para vencer nesses mercados, então o que fazer?

Essa edição apresenta uma perspectiva ampla, e ainda assim muito prática, sobre erros e acertos em três tópicos fundamentais: posicionamento, mensagem e competição.

Nessa edição:

  • Sua startup contra um gorila de 250kg

  • Erros e acertos em Posicionamento

  • Erros e acertos em Mensagem

  • Erros e acertos em Competição

Tempo para escrever: 7 horas
Tempo de leitura: 16 minutos

Geralmente as startups adentram a arena com seus sonhos e indignações e se deparam com um gorila de 250 quilos cheio de dinheiro, experiência e autoridade.

As emocionantes histórias de sucesso de algumas startups ocultam o resultado mais comum desse conflito: 74% das startups brasileiras fecham após 5 anos.

Incumbente vendo você apagar as luzes depois de passar anos chamando ele de ultrapassado.

Raramente conseguimos identificar com clareza quais elementos tiveram papel mais substancial no sucesso de uma empresa. Mesmo benchmarks e estudos de caso capturam apenas um angulo da história.

Ainda assim, você é o desafiante na arena.

Dizer que você tem apenas 25% de chance de sobreviver e que seus estudos são insuficientes também não te ajuda a prosperar. Então organizei conselhos práticos em torno de três dos assuntos mais comuns na cena das startups: posicionamento, mensagem e competição.

Para cada um desses assuntos eu abordo um erro severo que te fará levar surra de gorila e um caminho prático para construir uma pequena vantagem competitiva.

Tópico 1: Posicionamento

Qual é o resultado do confronto direto?

❌ Criar uma nova categoria

Fundadores e fundadoras tem um tesão inexplicável pela ideia de fundarem uma nova categoria.

As histórias da Uber (ridesharing), Salesforce (o SaaS original/cloud crm), Apple (tablets) ou Hubspot (inbound marketing) são como canto da sereia, te seduzindo direto para o fundo do mar.

Esses exemplos sofrem do viés da sobrevivência e ocultam uma desproporcional quantidade de tentativas frustradas.

Criar uma categoria raramente é possível. Quando possível, raramente está associada ao sucesso. E quando bem sucedido, raramente significa domínio absoluto.

O surgimento da categoria de buscadores é um exemplo clássico de como ser first mover não é necessariamente uma vantagem. O primeiro buscador do mundo foi criado em 1990 e se chamava Archie, Yahoo foi fundada em 1994 e o inquestionável líder de mercado - Google - em 1998.

Já o mercado de streamings e airfryer ilustram a criação bem sucedida de uma categoria seguida por competição brutal.

Se, contra todas as probabilidades, você decidir seguir por esse caminho, prepare-se para lidar com uma camada extra de complexidade: explicar algo que não existe.

Geralmente a solução é ancorar em algo que existe e correr o risco de ser confundido com isso ou explicar de forma totalmente nova e correr o risco de não ser compreendido.

Por muito tempo a Swile e outras startups concorrentes tentaram criar uma nova categoria - benefícios flexíveis - como forma de separar sua solução dos tradicionais vale-refeição e alimentação.

Enquanto recurso narrativo associado a uma funcionalidade, a ideia prosperou, mas apesar do aumento do poder de fogo e da maturidade do mercado (a Swile, por exemplo, levantou quase 300 milhões de euros e cresceu quase 40x no Brasil em 4 anos), nenhuma startup manteve seu posicionamento dessa forma.

A vida nas startups já é difícil o suficiente, não torne ela ainda pior voluntariamente.

✅ Estratégia do pino de boliche

Sejamos honestos: seu produto provavelmente não é tão bom quanto você defende.

Sua startup está há um punhado de anos no mercado, você pivotou algumas vezes e tomou algumas decisões erradas no caminho. Nesse cenário, você criou pouca coisa realmente útil.

E o processo é esse mesmo, isso não é uma crítica. Você só não pode esperar que seus potenciais clientes troquem seus canhões com mira laser por esse graveto molhado aí.

Por isso seu ataque ao mercado precisa ser semelhante ao que faz um jogador de boliche: o objetivo é derrubar os dez pinos, mas um jogador experiente ataca um único pino na expectativa de criar uma reação em cadeia que leve ao strike.

Cada pino representa um nicho do seu mercado, onde um deles é mais aderente à proposta de valor atual de seu produto e dominá-lo é o que te aproximará do pino subsequente.

Confira essa história:

Não há ninguém no mundo que trabalhou em mais posicionamentos de empresas do que April Dunford, expert no tópico e autora de Obviously Awesome e Sales Pitch.

Eu não tenho o calibre dela, mas poucas pessoas no mundo escutaram mais entrevistas com ela do que eu - meu Spotify registra quase 40 episódios - e uma história em particular ilustra bem essa estratégia: Janna Systems

O posicionamento inicial da Janna Systems era o de CRM Enterprise, um mercado dominado por um gorila chamado Siebel com 8.000 funcionários e receita de 2 bilhões de dólares.

Quando comparado com este competidor, a solução era inferior sob qualquer angulo, mas a existência de uma única funcionalidade capaz de mapear/modelar relacionamentos chamou a atenção de um pequeno grupo de empresas que alavanca suas vendas a partir do networking: bancos de investimento.

Então Janna Systems substituiu a busca pelo strike (Enterprise CRM) pelo pino mais ao seu alcance: CRM para bancos de investimento.

This shift in positioning allowed us to grow very quickly over the next 18 months from under $2M to close to $80M. Our plan was to shift the positioning to CRM for Financial Services as we expanded to retail banks and insurance companies. We didn’t get the chance to test that positioning evolution however - Siebel acquired us for $1.3B revenue. 

Essa foi a estratégia inicial do Facebook ao iniciar sua operação em Harvard, expandir para outras universidades e só então alcançar o público geral. E também da Uber e do Yelp ao lançarem seus serviços em uma única cidade.

É preciso reconhecer que é necessário tempo para construir valor e que, no processo, segmentos do seu mercado terão diferentes níveis de aderência a sua proposta de valor. Priorizar esses segmentos é o que te leva ao strike.

Tópico 2: Mensagem

O novo jeito vs. o velho jeito

❌ O novo jeito de fazer X

Praticamente toda startup tem o mesmo pano de fundo: uma pessoa frustrada com as formas disponíveis de resolver um problema decide criar uma empresa para fazer isso de uma nova forma.

É natural que a história da equipe fundadora seja incorporada na mensagem da empresa: a QuintoAndar é o novo jeito de alugar imóveis, a Swile é o novo jeito de oferecer benefícios e a Alice é o novo jeito de oferecer planos de saúde.

Essa ideia é aceitável e pode até funcionar, mas dois elementos podem enfraquecer a sua história.

Ao contrário do senso comum, a narrativa “novo vs. velho” é prejudicial para startups.

Ela faz sentido sob a ótica do empregador e empregado, falar de inovação, prometer disrupção, fazer parte dos azarões e vencer é sexy.

Por outro lado, trabalhar em um incumbente é como lutar boxe contra alguém de 80 anos: vencer é covardia e perder é vergonhoso.

Mas o mercado não pensa como seu time.

Primeiro, em muitas situações "novo" é apenas uma hipérbole para "levemente diferente”, criando expectativas na audiência apenas para frustrá-la.

Segundo, “novo” parece óbvio, mas é abstrato e sem significado. Nesse exato momento eu estou usando o "novo jeito de escrever newsletters” para te entregar essa edição. Perceba que você não consegue interpretar o que isso significa.

Terceiro, é provável que sua audiência ancore o que você faz ao que já existe para fins de interpretação. Você diz “somos o novo jeito de comprar e vender imóveis“ e sua audiência entende “somos uma imobiliária".

E, com essa ideia pré-concebida vem todas as inferências, preconceitos e conclusões, um monte de barreiras adicionais que precisam ser superadas apenas para justificar seu posicionamento.

Por fim, e certamente mais importante: o novo não representa valor.

Pelo contrário, geralmente significa incerteza, inexperiência, instabilidade e risco. Já o velho é um diferencial por si só: solidez, expertise, soluções completas com produtos estáveis.

Todo mundo sabe: ninguém nunca foi demitido por contratar IBM.

É possível que esse posicionamento funcione, há de existir empresas bem sucedidas que trilharam esse caminho. Como regra geral, porém, é melhor mostrar o novo jeito de fazer alguma coisa ao invés de falar, clássica técnica criativa “show, don't tell".

✅ Copywriting como ciência

Copywriting é a habilidade mais subestimada do marketing. Não necessariamente a mais importante, mas certamente a mais subestimada.

Pra começar, é fácil confundir "saber escrever” com “saber escrever de forma persuasiva” e considerar um punhado de frases ou parágrafos bem escritos como um bom trabalho.

Poucas pessoas tem conhecimento técnico sobre o assunto - poucos estudaram Ogilvy, Sugarman, Hopkins ou Conroy - o que mantém as técnicas e oportunidades fora do radar.

Pra finalizar, a exposição massiva ao produto e narrativas dessensibiliza os times das startups para os assunto, fazendo-os confundir seu nível de conhecimento com o nível do mercado.

Na edição Product-Market Fit: você sabe o que é, mas não aplica dessa newsletter eu fiz um exercício simples:

No momento em que escrevo essa edição, a homepage de uma startup famosa diz: “Feito para pessoas. Criado pensando na produtividade”.

Estamos falando do Canva, Slack ou GSuite?

27/03/2024

A frase em questão é a primeira coisa que aparece na home do Slack, mas se a sua definição pode ser confundida com outra empresa, ela não é boa o suficiente.

Copywriting é um tema tão profundo que merece uma edição dedicada, mas para garantir o terreno elevado (hello there! 👀 ) no seu confronto contra o gorila, este é o ponto de partida para evitar uma mensagem ruim:

Escreva com uma pessoa em mente.

Não um grupo, não uma persona, uma pessoa. Sua mãe, aquele amigo que compra o que você vende ou aquela mina com quem você almoçou para fazer um benchmark.

Sua mensagem deve reagir visceralmente com um pequeno grupo de pessoas, ela não é pensada para ser entendida por todos.

Escreva literal e específicamente.

Alguns termos parecem aportar valor ao texto, sem perceber que o que dá sentido a ele é justamente o nosso envolvimento.

Portanto, evite a hype e o marquetês.

Cada palavra deve ter uma função. Entre duas palavras, escolha sempre a mais simples; entre duas palavras simples, escolha a mais curta.

Paul Valéry

Deve-se evitar a hype porque na maioria das vezes temos uma compreensão intuitiva sobre os termos do momento, quando eu falo que um texto foi criado por IA generativa, você compreende o contexto sem necessariamente saber o que isso significa.

O idioma oficial da marketinglândia carrega de anglicismos e viéses da profissão, geralmente há um abismo entre a forma como marqueteiros explicam seus produtos em seus sites, landing pages e decks e a forma como sua audiência discute o mesmo assunto.

Deixe descansar

Crie com paciência, muitas boas ideias parecerão ruins na manhã seguinte.

Na última edição o Felipe Collins elabora com ainda mais detalhes a importância de uma mensagem consistente na jornada do usuário:

Tópico 3: Competição

Ignorar o monstro não faz ele sumir

❌ Preconceito com competidores

Você odeia o jeito como as coisas eram feitas antes de você, essa é justamente a razão pelo qual sua startup existe. Você é completamente diferente, mas seus clientes insistem em te comparar com “aquela empresa lá”.

Então você entra em negação: “nós não competimos contra o incumbente”.

Então você engaja os times de marketing e vendas, aciona thought leaders numa tentativa de educar o mercado sobre o que você realmente é e porque eles não devem te colocar no mesmo balde do resto.

Essa é uma visão centrada na empresa ou, ainda pior, no ego. Um cenário onde parecer diferente é mais importante do que ser diferente.

Mas ignorar o monstro não faz ele deixar de existir. Há dois elementos que tornam esse comportamento ainda mais nocivo.

Primeiro, crenças populares são difíceis de mudar. Por vezes estão tão enraizadas que requerem esforço coletivo de todo um segmento para mudá-las, como é o caso do reposicionamento dos refrigerantes diet para zero.

Em segundo lugar, sua visão e o “sonho grande” não são relevantes. Não importa o esperneio, seu cliente ainda fará associações e buscará similaridades entre as alternativas na mesa. A interpretação dele é a única coisa relevante nessa história.

✅ Alternativas competitivas

É mais apropriado, portanto, direcionar sua energia para identificar o que seu cliente faria se o seu produto ou empresa não existissem.

A resposta para essa pergunta é chamada de alternativas competitivas. Esse exercício promove um diagnóstico ampliado sobre o mercado onde você está inserido a partir de quatro diferentes caminhos alternativos, sendo eles:

Status Quo

Clássico caso onde o cliente entende que continuar fazendo a mesma coisa é a melhor opção, decisão geralmente associada ao custo de mudar e alto time-to-value.

Indecisão

O estudo realizado por Matthew Dixon a partir de 2.5 milhões de ligações de vendas, e publicado no livro The Jolt Effect, aponta que 40-60% dos leads qualificados são descartados por “no decision”.

É interessante notar, porém, que a maioria das perdas não é reflexo da preferência pelo de sempre, mas consequência da incapacidade de se tomar uma decisão segura.

Competidores de curto prazo

Nem todo competidor é uma alternativa. Se você tem um CRM para pequenas empresas, por definição você compete contra a Salesforce, mas ela provavelmente não é uma alternativa competitiva. Competidores de curto prazo são aqueles que aparecem na shortlist de seus clientes.

Potenciais competidores

Muitas empresas não competem com você hoje, mas representam potenciais riscos e possuem a capacidade de entrar em seu mercado a qualquer momento, essa lista tem pouco valor para o time comercial, mas geralmente é valiosa para times de produto.

Essas ideias não representam um playbook para o sucesso, um bom trabalho em posicionamento, mensagem e competição não é suficiente para vencer o gorila, mas te ajudam a sobreviver por tempo suficiente para descobrir o que precisa ser feito.

Estratégias complexas dependem dos fundamentos bem executados, não subestime o impacto do básico bem feito.

Qual a nota dessa edição?

(pessoas educadas respondem)

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