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Realidade, Escuta, Compromisso: os gatilhos finais de Confiança
Amazon, Old Spice e Google estão entre os cases na análise dos comportamentos de "Speed of Trust" para aumentar a confiança

Hello! Parte final da série sobre Confiança e Marketing, fruto da minha leitura recente do bom livro “The Speed of Trust”, do Stephen M. R. Covey.
Parte 2: Os 6 primeiros comportamentos
Hoje vamos no mesmo esquema da edição anterior.
Eu faço um resumo do comportamento.
Na sequência falo uma marca que usou isso como estratégia
E como você pode usar na sua empresa ou carreira.
Tem uma diferença, só: esses comportamentos são mais relacionados a competência do que caráter (como a edição anterior). Por isso, estão muito mais mesclados e há uma grande chance de overlap entre eles.
Antes de começar, um spoiler: 👂️ 🔉

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🧠 Tempo para escrever: 5 horas
📖 Tempo de leitura: 22 minutos
✍️ Na última edição: Como formar um bom time de marketing: da estrutura à entrevista
Comentários da última edição:
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Os 13 Comportamentos - Parte 2
Melhore e aprenda (Get Better First)
Continuously improve by learning, growing and renewing yourself. Others will develop confidence in your ability to succeed in a rapidly changing environment.
Você precisa melhorar de maneira constante. Antes de esperar qualquer movimentação dos seus clientes ou pares. Melhorias técnicas, de conhecimento, de atitudes, de competências.
Aprender e crescer - meio “kaizen” (melhoria contínua), meio “beginner’s mind” (mentalidade de principiante) do zen-budismo.
Não é só estudar, é aplicar também. Casa bem com o ciclo ágil de construir, medir e aprender que usamos em startups, e até com o nosso ciclo de growth.
Você não está acima do feedback dos outros, então precisa criar sistemas para capturar esse feedback e trabalhar em cima dele.
Case: Google e o PageRank

Olha a carinha do Google em 1998, segundo o Web Design Museum
Não sei se você era nascido essa época, mas houve um momento que o Google não existia (fundado em 1998), e outro momento que ele ainda não era o principal buscador da internet.
Essa glória ficava com o Yahoo!, Altavista e Microsoft, ainda com buscadores muito descentralizados (alguém lembra do Cadê?).
O Google começou a ser desenvolvido em 1996 por Sergey Brin e Larry Page ainda como um trabalho acadêmico de Stanford, tendo no Page Rank o seu principal algoritmo para classificação das páginas a serem mostradas em uma busca qualquer.
Enquanto os competidores já estavam surfando com campanhas e deals de venda de mídia, o Google ficou mais de dois anos só melhorando o produto e infraestrutura. Mesmo depois do lançamento, se prepararam para um volume muito maior de dados e pesquisas com updates gigantes em 2003 e 2004 (Google File System e Map Reduce).
Essa melhoria técnica fez com que já em 2004 o Google se tornasse o buscador #1 de acordo com a Comscore/Nielsen, e no longo prazo levou todos os outros buscadores a se tornarem fração irrelevante do mercado (pelo menos até 2025, né ChatGPT)
Como usar hoje:
Ciclo de construir, medir e aprender: muito da mentalidade experimental de growth encaixa direitinho com essa característica. Testar primeiro. escalar depois.
Capacitação constante: vale para você “pessoa física” e para o seu time. Quer resultado melhor? Aprende mais. Estuda mais. Se capacita. Simples.
Confronte a Realidade:
Enfrente a realidade nua e crua de frente. Sem meias palavras. Sem tapar o sol com a peneira.
Evitar esse enfrentamento e ignorar os problemas causam uma perda tremenda em velocidade e um aumento de custo também gigante para qualquer pessoa ou empresa, segundo Covey.
Conversas difíceis precisam ser realizadas o quanto antes, sem nenhum tipo de máscara.
Uma prova de fogo recente foi o que aconteceu na pandemia - quem conseguiu ver de frente e adaptar o seu negócio ao tal “novo normal” (que expressão feia, socorro), eventualmente com cortes e revisão de expectativa, conseguiu ser mais resiliente.
Case: Old Spice
“Look at your man. Now back to me. Sadly, he isn’t me”
Essa campanha da Old Spice (criação da Wieden + Kennedy, eleita pela AdAge uma das maiores do Século 21) é um exemplo claro e muito divertido de você confrontar a realidade. E de como dá para transformá-la em oportunidade com um bom copy.
Pedir para a moça olhar para o “seu homem” e depois para o ator bonitão da foto certamente dá um choque e o tom necessário para falarem da linha de sabonetes líquidos masculinos da marca.
Mas o que muita gente não sabe é que essa campanha surgiu também por um confronto da realidade: a Old Spice estava perdendo relevância especialmente nas camadas mais jovens. E eles também descobriram que as mulheres são responsáveis por mais de 60% das compras de body wash, mesmo para homens.
Então lançaram essa campanha em fevereiro de 2010. A expectativa era de crescer em 15% as vendas até maio do mesmo ano, mas eles estouraram e cresceram 60% no mesmo período. Em Julho, as vendas dobraram, de acordo com esse case.
Como usar hoje:
Não esconda más notícias: comunique cedo e com clareza. Não deixe a fofoca se espalhar sem nenhuma versão oficial (também tem a ver com o “esclareça as expectativas” que vem logo a seguir).
Olhe para os dados desconfortáveis: temos o costume de olhar mais para o que está indo bem, e de mostrar mais essas informações. Recomendo fazer o contrário: pegar o número que está mais c*gado na organização/funil/área e olhar obsessivamente para como melhorá-lo.
Apuração primária e perspectiva: Muitas vezes a gente está tão imerso em uma realidade ou tão comprado com uma proposta de valor (“meu produto é bem melhor”) que esquece que o que importa é o olhar do cliente. Peça feedback brutal, vá você mesmo ver como ele usa o teu produto e como te compara com o mercado. Sem pesquisas externas, só você e a boa e velha validação.
Esclareça Expectativas
Você ganha a confiança dos outros quando eles sabem o que esperar de você. Covey lembra que a maior parte dos conflitos nasce não de má-fé, mas de expectativas mal definidas e combinadas. Clarify Expectations.
Esse comportamento casa muito com outros da lista sobre honrar sua palavra - mas é mais específico em configurar exatamente o que podem esperar de você.
O melhor a se fazer é criar uma visão compartilhada desde o início, mesmo se isso incluir abrir sobre os pontos negativos e de desenvolvimento com clareza. Nada de “isso aqui é bom, bonito e barato (e rápido e fácil e zás)”, sem trade-offs.
A clareza quando você dá a expectativa é algo que aumenta muito a confiança. Definir prazos reais, estimar exatamente o que é para ser feito (definition of done), custos envolvidos e limitações, por exemplo.
Mas vai até em uma camada mais estratégica como o posicionamento. Olha o case a seguir.
Case: Southwest Airlines

Campanha da Southwest em 1971: disrupção no setor de aviação
Uma linha aérea que te afirma em todos os pontos de comunicação que não tem primeira classe, não tem refeição a bordo, não tem entretenimento, nem nenhuma regalia. O que tem é pontualidade e preço baixo.
Essa foi a proposta da Southwest Airlines para ganhar um bom bocado de mercado desde sua chegada em 1971 (aviação ainda era visto como luxo). Eles entraram com o “no-frills” - sem essas frescuras.
Mesmo as regras de embarque e desembarque foram alteradas para o avião ficar o menor tempo possível dentro de um aeroporto.
Essa máxima de operar com eficiência e low cost fez com que a companhia tivesse 47 anos consecutivos de lucro, de 1973 até 2019 — algo inédito na indústria.
É um case de posicionamento estudado mundo afora, porque é um dos poucos que bate no peito e fala que vai operar em um preço menor e uma expectativa clara. Lembro de estudá-los em um curso de estratégia de Wharton que eu fiz, inclusive.
Essa máxima de operar com eficiência e low cost fez com que a companhia tivesse 47 anos consecutivos de lucro, de 1973 até 2019 — algo inédito na indústria.
[Vou mandar no grupinho Premium os PDFs desse estudo de caso]
Como usar hoje:
Seja específico: Em vez de "entrega rápida", diga "entrega em 2-3 dias úteis para SP capital". Ou “entraremos em contato em até 2 horas” em vez de “em breve”
Promessa clara concede vantagem — Quando você entrega exatamente o que promete, evita frustrações. A Southwest é exemplo disso ao comunicar e cumprir sua proposta simples e replicável.
É-Não É / Faz - Não Faz: essa eu gosto especialmente para explicar internamente um produto ou serviço: uma tabelinha com as dores que você cumpre e não cumpre, features que você tem ou não. Te dá um contorno bem mais claro do produto.
Trade-offs: Aqui vale especialmente para quem trabalha com serviço: explique que há um trade off entre custo, velocidade e entrega. Calibre a expectativa.
“Assuma seus BOs” (Practice Accountability)
Você ganha a confiança dos outros quando assume as suas responsabilidades. E também quando faz os outros assumirem as responsabilidades deles. Simples assim.
A correlação direta que eu faço é com o “Extreme Ownership”, livro e TED Talk do Jocko Willink. Sem essa de apontar o dedo, culpar o juiz ou fugir da reta.
Quando você se responsabiliza, cria um ambiente em que a alta performance floresce. Bons profissionais querem ser cobrados, querem clareza sobre métricas e entregas.
E quando uma marca assume a responsabilidade sobre algo, ela também ganha credibilidade - e inclusive pode contornar grandes crises (vide o exemplo do Tylenol na parte anterior).
Case: Salesforce e o gap salarial
Em 2015, o CEO da Salesforce foi confrontado por duas executivas da companhia em relação ao gap salarial entre homens e mulheres. Marc Benioff inicialmente negou essa disparidade e pediu auditoria… que comprovou a tese.
Homens ganhavam bem mais do que as mulheres para executar a mesma função.
Quando souberam que o erro era real, eles agiram com vigor: investiram USD 3 milhões para equalizar os salários, e mais a mesma quantia depois de uma série de M&A’s que voltaram a trazer disparidade. Essa matéria da Wired conta bem o causo, esse vídeo da CBS tem a entrevista completa.
Desde então, eles publicam um “Annual Equity Update” e tem até um cargo de Chief Equality Officer para prestar contas. “Nós temos os dados. Sabemos quanto todo mundo ganha. Não existe nenhuma desculpa para não equalizarmos”, disse Benioff.
Como usar hoje:
Publique KPIs mesmo quando estão ruins: a turma de marketing tem o mau hábito de eventualmente esconder os números ruins em meio a ótimas narrativas. Não faça isso. Se algo não está bem, encare e explique de frente.
Ponha peso na promessa: a 99 te promete uma corrida em 99 segundos, se não você ganha 15% off na próxima. Esse compromisso “valendo grana” reforça accountability.
Atribua metas às pessoas, individualmente: seu mecanismo de avaliação vai ficar muito melhor quando cada um tem algo para chamar de seu, sem desculpas.
Escuta Ativa (Listen First)
Ouça primeiro. Fale depois. Mas ouça atentamente. Escuta ativa. Sem ser para rebater ou responder, mas sim para aprender com a contraparte. “Ouça” os gestos, o tom, a voz, os olhos.
Saber escutar é uma das grandes alavancas para aumentar a confiança dos outros em você. As pessoas se sentem entendidas (e de fato são).
Quando você faz aquele exercício de personas, ICP e consumidor ideal, ou quando você lista as dores que o seu produto resolve… para de ficar só na suposição.
Vai de fato escutar e conversar com o teu cliente. Sem querer vender, só para ouvir mesmo. Ver como ele usa o produto. Sai da tua bolha de ilusão. Vai “sentir o cheiro da goiaba”, como diria um professor de Jornalismo que tive.
Case: LEGO, a reinvenção escutada

Print de hoje do LEGO Ideas: ferramenta de P&D
A LEGO já esteve à beira da falência em 2003, com mais de USD 800 milhões em dívidas, vendas caindo 26% em relação ao ano anterior, menor relevância e falência iminente (18 meses de caixa). Então Jørgen Vig Knudstorp assumiu como CEO da companhia para fazer um dos turnarounds mais espetaculares que se tem notícia.
A empresa inventava muita moda com linhas de produtos, licenciamentos e coisas sem sentido. O executivo cortou ou congelou todas as linhas menos rentáveis e simplificou estrutura fabril e supply chain. E proibiu a marca de desenvolver e lançar novos produtos. Até entender direito o que fazer.
Mas isso só estancou a ferida. O que realmente virou o jogo foi que a companhia começou a escutar ativamente seus fãs e clientes - descobrindo uma outra avenida de crescimento nos adultos.
Já existia uma comunidade grande de Adult Fans of LEGO (AFOLs), com um gasto de milhares de dólares por ano no produto (muito mais que os USD 20 infantis). Esse grupo virou a maior fonte de P&D e inspiração da marca, que agora só lançava algo com demanda já validada pelos grupos.
Inspirado nesse grupo, eles ampliaram a estratégia de comunidade com o LEGO Ideas, onde qualquer pessoa pode submeter uma ideia de design no site, e se ela for aprovada com mais de 10 mil votos, se tornava um produto oficial - e o criador levava ainda 1% dos royalties de venda.
Essa entrevista que o Knudstorp deu para a Harvard Business Review conta bem o causo, bem como esse case do MIT Sloan o livro “Brick by Brick”.
Como usar hoje:
Pesquisa primária: nada de Google Survey ou Typeform. Nada de “o time de vendas/CS me disse que”. Vai VOCÊ entender direito o seu cliente e o caso de uso do seu produto. De verdade.
Encontre sua comunidade: Procure onde seus usuários mais apaixonados se reúnem - Discord, Reddit, LinkedIn, botecos. Muitas vezes há mais insights numa thread não-oficial que em 10 focus groups
Mantenha Compromissos
Faça o que você disse que faria. No prazo que disse que faria. Com a qualidade que você prometeu. Simples assim. Prometeu, cumpriu. Esse valor tem muito a ver com um anterior (Entregue Resultados), mas tem mais a ver com a sua palavra.
Covey define como "estabelecer expectativas claras e depois superá-las de forma consistente". Esse ponto sempre me pegou em marketing, já que a gente adora prometer. Não cumprir é a receita para o desastre (churn, reclamação, post em rede social…).
Esse ponto casa bastante com o gatilho de comprometimento que o Cialdini fala lá no “Armas da Persuasão”, aliás. Quando você é consistente, pode esperar evolução e uma reação mais previsível e esperada do público.
Case: Amazon e “It’s Always Day One”
Desde 1997 Jeff Bezos envia uma carta para os seus acionistas (aqui a original). Nela, o CEO da Amazon repete sempre “It’s always Day 1”. Em todo report de resultados, ele repetia esse mantra de “Dia 1”, reafirmando que teria foco exclusivo no longo prazo e seria obsessivo em favor aos seus clientes.
Ele tomou muita pressão de Wall Street por conta disso, já que o mercado prefere lucro do que só reinvestimento. Mas manteve a diretriz da companhia - que hoje é top 10 no Mundo em valor.
Uma página oficial da AWS explica ponto a ponto da cultura. São mais de 20 anos afirmando ser sempre o Dia 1.
Dia 2 é um êxtase. Seguido por irrelevância. Seguida por um declínio doloroso e excruciante. Seguido pela morte. E é por isso que é sempre Dia 1
Como usar hoje:
Honre limites de oferta: "Apenas 50 vagas com 75% off" significa parar exatamente na unidade 50, mesmo que a demanda seja maior. Use contadores reais, não "marketing de escassez" falso. Não existe “é só até amanhã” todo dia, Casas Bahia.
Cronograma de conteúdo público: A gente promete essa newsletter toda quinta às 10h07 na sua caixa de entrada. Em 79 semanas desde a fundação, não perdemos nenhuma semana (no máximo 20 horas de atraso).
Cumpra prazos de campanha religiosamente: Simplesmente não seja como o GTA VI que adiou de novo a data de lançamento ☹️
Estenda Confiança (Extend Trust)
Confiança é um verbo, então precisa de prática. E confiar nos outros te faz também ter mais a confiança deles - é o que diz o último dos comportamentos do “The Speed of Trust”. Eu confio em você, você confia em mim.
Aqui a gente tem bastante do gatilho de reciprocidade do Robert Cialdini.
O Covey menciona bastante desse comportamento especialmente em situação de liderança, quando você precisa confiar não só tarefas mas também decisões aos seus chefiados - dar autonomia mesmo. Vai contra a cultura do “Cover Your Ass” de ninguém confiar em ninguém e todo mundo tirar o seu da reta.
Case: Ritz-Carlton
O Ritz-Carlton, uma rede de hoteis de luxo. A política da companhia indica que qualquer funcionário pode gastar até USD 2 mil por hóspede, por dia, sem nenhuma aprovação necessária.
Esse empoderamento faz com que o time não só dê mimos aos hóspedes (chocolatinho, pasta de dente, coisa do tipo), mas que também resolva problemas - tem o causo de um funcionário que foi até o Havaí só para devolver um laptop esquecido.
Na prática, os “Ladies and Gentlemen” (adorei como eles chamam os funcionários) gastam muito menos, mas a regra serve para reforçar a confiança e autonomia (claro, depois de um treinamento extenso).
Como usar hoje:
Políticas de devolução generosas sem interrogatório nem letras miúdas - você confia no teu cliente e ele em você. É o que fez a Zappos crescer vertiginosamente até ser comprada pela Amazon - 365 dias por ano, frete grátis na devolução, nenhum custo adicional.
Delegue com autoridade real: não adianta dar a tarefa sem dar orçamento ou autonomia para decidir.
Dê um limite que não precisa de aprovação: seja em orçamento ou nível de tarefa ou mudança, dê aos liderados um espaço de autonomia total, sem precisar aprovar mil coisas com você.
Confia em mim e me avalia por essa edição :)
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